Marta Antunes de Moura
A morte do corpo físico é fenômeno natural que atinge todos os
seres da Criação, cedo ou tarde. A desencarnação acontece quando os laços perispirituais,
até então mantidos enraizados, molécula a molécula no corpo físico, se
desfazem, concedendo liberdade ao Espírito que passa a viver em outra dimensão
da vida.
Segundo o Espiritismo, a morte é “[...] uma simples mudança
de estado, a destruição de uma forma frágil que já não proporciona à vida as
condições necessárias ao seu funcionamento e à sua evolução. [...].1Ensina igualmente: a separação
do Espírito do corpo que lhe pertencia não é dolorosa,
sobretudo quando das mortes naturais, que decorre dos desgastes biológicos dos
órgãos2, como também
não é uma separação brusca. A “alma se desprende gradualmente e não
escapa como um pássaro cativo a que se restituiu subitamente a
liberdade.[...].”3 Assim,nunca
é demais lembrar:
[...] A observação comprova que, no
instante da morte, o desprendimento do perispírito não se completa subitamente;
que se opera gradualmente e com uma lentidão muito variável conforme os
indivíduos. Em uns é bastante rápido, podendo dizer-se que o momento da morte é
também o da libertação, que se verifica logo após; em outros, sobretudo
naqueles cuja vida foi toda material e sensual, o desprendimento é
muito menos rápido, durando algumas vezes dias, semanas e até meses, o que não
implica a existência, no corpo, da menor vitalidade, nem a possibilidade de um
retorno à vida. [...].De fato, é racional
conceber-se que, quanto mais o Espírito se tenha identificado com a
matéria, tanto mais penoso lhe seja separar-se dela, ao passo que a
atividade intelectual e moral e a elevação dos pensamentos operam um começo de
desprendimento, mesmo a vida durante o corpo.[...].4
A falência dos órgãos e o desprendimento perispírito que se segue
definem o estado de transição ou de passagem de um plano para outro. Neste momento, o Espírito encontra-se
inconsciente5, situação que pode
perdurar por um maior ou menor espaço de tempo, da acordo com as condições
pessoais de cada um.
A chegada no plano espiritual, porém, pode ser sofrida ou
não. Trata-se de um sofrimento moral. É a alma que sofre, não o corpo, pois
este transforma em matéria inerte, morta, em processo de decomposição. O
sofrimento poderá ser mais agravado se o Espírito se manter jungido ao
corpo em decomposição e à vida que se extinguiu.
Situações semelhantes são encontradas em certos gêneros de suicídios, em
homicídios; em desencarnantes presos a profundos remorsos, ou, ainda, em
Espíritos vinculados aos prazeres da vida material, apegados excessivamente a
bens e/ou pessoas. Nestas circunstâncias, a morte é vista como uma perda
irreparável, um sofrimento atroz, uma sensação de destruição total, porque ele,
o Espírito, desconhece a sua própria imortalidade que existe e preexiste à
morte do veículo somático.
Situação bem diversa acontece com o Espírito que durante a
existência se deixou conduzir por uma vida mais simples, sem ganâncias ou
ambições exageradas; que procurou desenvolver virtudes, combatendo
imperfeições; que praticou a caridade, promovendo o bem; que cumpriu os seus
deveres familiares, profissionais e sociais.
A sua desencarnação será mais amena; os sofrimentos e as
angústias do período de transição serão passageiros e breves; a
adaptação na nova moradia será tranquila, sabendo administrar com
serenidade a saudade dos entes queridos que permanecem reencarnados, e as
surpresas do além-túmulo.
Ajustado à vida no plano espiritual, o Espírito colherá,
então, os frutos, bons ou amargos, do que semeou durante a
experiência reencarnatória, se submetendo, no final das contas, à lei de
progresso. É o que nos lembra André Luiz quando aponta o valor da
desencarnação como lei divina:
Toda morte traz dor.
Sem a desencarnação, porém, não
atingiríamos a renovação precisa, largando processos menos felizes de vivência
ou livrando-nos da caducidade no terreno das formas.
Compreendamos, em face disso, que não
podemos louvar as dificuldades que nos rodeiam, mas é imperioso reconhecer que,
sem elas, eternizaríamos paixões, enganos, desequilíbrios e desacertos, motivo
pelo qual será justo interpretá-las por chaves libertadoras, que funcionam em
nosso Espírito, a fim de que nosso Espírito se mude para o que deve ser,
mudando em si e fora de si tudo aquilo que lhe compete mudar.6
Bibliografia
1.
DENIS, Léon. O Problema do
Ser, do Destino e da Dor. 1. ed. Rio de Janeiro:FEB, 2008. 1ª Parte (O
Problema do Ser), cap. X (A morte), p.175.
2.
KARDEC, Allan. O livro dos
espíritos. céu e o inferno. Tradução de Evandro Noleto
Bezerra.4. ed. 1. Imp. Brasília: FEB: 2013. Questão 154-comentário, pág. 113.
3.
______. Questão 155-a, pág. 113.
4.
______. Questão 155-a-comentário,
p.114.
5.
______. O céu e o inferno. Tradução
de Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1. Imp. Brasília: FEB: 2013. 2ª Parte. Cap.
I, it.7, pág. 157.
6.
XAVIER, Francisco Cândido/WORM,
Fernando. Janela para a vida. 1. Ed. Porto Alegre: Francisco
Spinelli, 2014. Cap. VI, , p. 128
Fonte: http://www.febnet.org.br/blog/geral/colunistas/a-desencarnacao/